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Jasmim


Sementinha de mim.
Sementinha minha.

Sem mim.

Jaz em mim
um jasmim.

"Apple Tree", Klimt, 1903.

Neste Natal



Neste Natal
recuso-me a ser superficial
não quero as conversas fáticas
nem as relações fálicas
quero a intensidade, o apego
embora tenha medo

Neste Natal
recuso os preconceitos, o desprezo
quero ser diverso e igual
como verso impresso e digital
como o sorriso negro e virginal
embora seja leigo

Neste Natal
recuso a espera eterna
que me caiba o antigo jeans
a crença de que a ortografia
com o trema melhor ficaria
e a coluna do meio, pois sou inteiro

Neste Natal
recuso-me a ser posseiro
não tenho fama nem dinheiro
quero andar descalço na grama
mas sem pisar no formigueiro
dar boas vindas à mudança
pois é chato ser o mesmo

Neste Natal
recuso-me a me depreciar
se eu não me poupar, quem o fará?
aprendi que se amar não é só incumbência
mas também sobrevivência
nisso eu creio

Neste Natal
quero um novo lema
apesar das perdas, tudo me acena
não quero a pena nem a queixa
nada que me anoiteça
ainda que seja o final da cena
e o umbral do poema...


"A Sagrada Família Canigiani", Rafael, 1508.

coração de leão


essa fortaleza que vês é pele
essa dureza que vês são só ossos
essa firmeza apenas tendões

profundo e protegido é o
coração
núcleo destemido, ferido
de leão


"A Fallen Tree Trunk", Camuccini, 1850.

clandestino


amo-te com minhas estranhas entranhas
e com as vísceras não vistas

amo-te com meus fluidos sem uso
e com a saliva esquiva

amo-te com minhas veias e artérias
alheia e etérea

amo-te com minhas amígdalas
protegida escondida

e amo-te como quem dorme
e amo-te como quem foge



"Tulips field in Holland", Monet, 1886.

abraço




às vezes meus braços são de aço
às vezes são só laços
e são, às vezes, sem embaraço
meu próprio baço

e mesmo assim

só caçam ossos, o cálcio de outros braços
para cessar os traços dos espaços
no estrado, no colágeno
por um breve e bravo instante

no tácito e impávido teu abraço




"Fulfillment", detail of "Tree of life", Klimt, 1909.

poema singelo



queria que minha poesia
levantasse uma Bandeira
queria dos Barros a singeleza
teria o meu porquinho-da-índia
e nela contida toda a natureza



"The woman with the roses", Chagall, 1929.

casulo



esse muro grande
entre nós
é mudo

essa glande
esse algoz
é escudo

que frustrante
estamos sós
num casulo


"The Astronomer", Vermeer, 1668.

* Sitiante (à minha mãe)



Apartaste.


E aqui fica a certeza da alma nublada.
Arrancada dos muros do amor materno,
Conhecedor da destreza do poeta
Sabedor do ente parido

Confundiu-me a abóbada de teus cuidados
A transmutação do pranto em felicidade
Tão
profundamente humana e por isso
Afetuosamente desumana

Renovado o outono a cada instante
A educar os fragmentos de teus sorrisos ainda nesta morada
E o suplício de teu silêncio falante
A chover tua voz em brio

É ali a minha pátria, a mais remota casa.


O ditame ilimitado daquele mundo errante
Não se equipara ao irrelevante barro
Mas aos alísios de nordeste que trazem a precipitação
Dá vida e perpetua a vida

Retirei-me do abissal ventre da mulher deixando raízes
Plantando vestígios em outros colos
Pois aqui fora restou-me apenas

A tenra matéria de sua placenta





"Publicação especial para a Homenagem Coletiva do Dia das Mães, promovida pelo Fio de Ariadne.
Visite: http://fio-de-ariadne.blogspot.com


"A mãe e o filho", Gustav Klimt, 1905.

Jardim


Reparto-me e refaço-me.

Árvore.


A revestir-te e proteger-te.

Pétalas.


A aninhar-te em cada parte.

Folhas e caule.


A prender-te.

Raiz.


P(á)ra...


... não perder-te.

Jardim.




"Jardim", Monet, 1906.